Antigamente era muito difícil conseguir gravar um disco.
Mesmo antes da fabricação de discos e fitas, era difícil ser cantor ou cantora.
A música era algo levado a sério, tinha que ter uma bela voz, ter muita técnica
vocal para poder cantar em rádios e ficar famoso. Até mesmo as composições
precisavam falar de algo que tivesse verdade, sentimento. Mesmo as marchinhas
de carnaval, ou as músicas populares cantadas em reuniões familiares e festas
religiosas, tinham alguma importância.
Hoje em dia a coisa é bem diferente. Uma mesma base pode
servir para muitas músicas, e qualquer um pode fazer sucesso. A prova disso é o
Funk e a Swingueira. Músicas que são mais para dançar, mas que são as mais
descartáveis que existem. Menos importante que o Aché music, que era ainda
menos importante que as marchinhas carnavalescas. Músicas feitas apenas para
uma estação, o verão ou o carnaval.
Tirando as marchinhas de carnaval, as outras músicas no
Brasil antes de existir a televisão eram muito importantes, românticas de
verdade, mesmo que fossem bregas ou as sertanejas. Se você pesquisar as músicas
antigas, verá quanto sentimento elas expõem. Mesmo sem a variedade de arranjos
possíveis hoje, elas são belas.
Com a chegada da televisão no Brasil, as coisas começaram a
desandar. Lentamente a tevê transformou as pessoas em mais consumistas do que
eram, e não só para os produtos anunciados por ela, mas em tudo; ou melhor
dizendo, transformou tudo em produto. Teatro, esportes, músicas – para a
televisão são só produtos.
Quando surgia um estilo no Brasil, como o rock’n’roll puro
dos anos sessenta, a tevê logo o transformava em um produto para prender a
atenção do povo. E o pior é que ninguém percebia isso, afinal é bom está
informado das novidades, saber o que anda acontecendo no mundo. E a partir daí,
tudo que surgia ou virava modinha e ia logo para a tevê, ou era um movimento
cultural que também acabava na televisão. Mas a culpa não é do Brasil, é
exclusiva da televisão; está acontecendo no mundo inteiro onde a tevê tenha
liberdade para apresentar o que quiser.
Até o começo dos anos oitenta, televisão era um artigo de
luxo, coisa da classe média ou alta, o país estava bem atrasado, ainda saindo
da ditadura, e o rádio era o meio principal de divulgar músicas, e era muito
difícil. Os lançamentos eram bem definidos por estações. Tinham bandas que
lançavam para o são João, outras para o verão e o carnaval. A MPB era formada
pelos famosos, os que tocavam nos rádios o ano todo; os que tinham músicas em
novelas ou em algum outro programa da tevê. Os cantores e bandas passavam três
anos para gravam um novo disco. Até então não se notava o efeito devastador que
a tevê vinha causando à cultura.
Foi nos anos oitenta quando muitas tevês foram vendidas para a
população, que as emissoras de televisão começaram a lutar por audiência, e por
isso tinham que mostrar coisas novas. E foi a partir daí que começou a pegar os
movimentos musicais e tirar proveito deles. Eu era criança na época do rock
brasileiro (bons tempos aqueles) e as bandas como RPM, Legião, Titãs, Paralamas
e outras estavam sempre aparecendo na tevê. Mas ainda era difícil fazer música,
e os jovens ainda tinham o sonho de ser um músico. Com a tevê transformando
música em produto, a maioria dos jovens daquela época começaram a fazer música
para ganhar dinheiro.
Tinha surgido o Axé music anos atrás, ritmo dançante para
o carnaval da Bahia, e então os jovens começaram a inventar modinhas, e veio o
novo sertanejo, o pagode, e não demorou para vir os dois ritmos mais descartáveis
da estória: A Swingueira, e anos depois o Funk. Sem falar nas muitas modinhas
“alguma coisa universitário” – como o forró pé de serra, o sertanejo, e etc. E
outras que tentam renovar o rock, como o movimento Emo. Música virou um
produto. Bandas e cantores passaram a gravar CDs todo ano, DVDs, shows ao vivo,
etc.
Voltando um pouco no tempo; quando surgiu o Axé music, era
música para um carnaval, mas não eram tão insignificantes como as de Funk e
Swingueira. Mesmo quem não gosta de Aché music, deve se lembrar ainda de
algumas músicas do Chiclete, Asas de águia, Jamil, e outras bandas daquela
época. Já as músicas de Swingueira e Funk de hoje em dia, você não lembra delas
quando se passa dois anos, são totalmente descartáveis. (Eu já vi minhas sobrinhas
que gostam de rebolar ouvindo Swingueira reclamar porque a música que estava
rolando numa festa era do ano passado). Algumas músicas são tão descartáveis,
que somem logo depois do carnaval. São músicas para dançar, mas não são como as
músicas da discoteca ou as marchinhas antigas, nem o Aché dos anos oitenta; as
músicas desses dois ritmos tem uma coreografia quase pornô, movimentos
repetitivos de pessoas rebolando e simulando sexo.
Eu me senti ofendido quando um apresentador comparou o
sucesso de um funk (acho que era aquele do lek, lek, lek) com o sucesso que um
dia fez o Tom Jobim. É vergonhoso que alguém compare qualquer música do Tom
Jobim (com arranjos incríveis) a um funk que é uma repetição de pouca
criatividade. E isso não é culpa exclusiva da televisão, a internet tem a sua
parcela. As pessoas não percebem que o consumismo acaba com a beleza das
coisas, que ao pedir essas músicas no rádio, estão tirando o espaço de grandes
músicos como Djavan, Caetano, Roberto e muitas bandas boas.
O problema é que estamos cada vez mais consumistas e com a
facilidade surgem centenas de bandas a cada ano. Às vezes algumas delas se
destacam não pela música, mas pela dança diferente do clipe dela. Hoje em dia,
as pessoas vão a shows não para curtir a música, mas para sair de casa ou
tentar encontrar companhia. O ruim disso tudo, é que, com a falta de espaço, as
bandas que antes queriam levar mensagens, contar estórias interessantes; estão
tentando ser popular, fazer um som que role na tevê, e é muito difícil hoje
encontrar uma banda ou cantor que não esteja fazendo música descartável.
Não estou julgando a qualidade das músicas, mas no geral, as músicas de hoje em dia não passam muita verdade. Acho que no futuro as pessoas ainda escutarão mais músicas das décadas de oitenta e noventa do que dessa época de 2000 aos dias de hoje.
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